Há muita coisa na literatura apocalíptica que funciona de forma muito semelhante à literatura profética. Mas há também muitas características que são próprias da literatura sapiencial. Há teóricos que dizem que a literatura apocalíptica é um desdobramento da literatura profética. Assim como eu tenho na literatura contemporânea uma literatura moderna e uma literatura pós-moderna, ou seja, uma é conseqüência, continuidade da outra, embora sejam coisas diferentes.
Há que se perceber três pontos importantes
1ª - Movimento apocalíptico
2ª - Literatura apocalíptica
3ª - Os apocalípticos
Estes três estão muito próximos uns dos outros, ao mesmo tempo em que são diferentes uns dos outros.
O movimento apocalíptico é um movimento sócio-político-economico-religioso, como qualquer outro movimento social. Assim como temos ao longo da história movimentos de direita, de esquerda, de operários, de sindicados, de bandeirantes, de cruzadas, que no fundo são acontecimentos históricos, mas que não se consegue precisar uma data e um lugar. O que pode se dizer sobre datas referente ao movimento apocalíptico é que ele começou por volta do séc. 2 a.C e se estendeu até o séc. 2 d.C. Seria o que chamamos de período intertestamentário. No movimento apocalíptico, vamos determinar algumas causas sociais que provocaram o surgimento deste movimento. Por exemplo, a falência das instituições religiosas oficiais de Israel. Israel tem basicamente três grandes garantias religiosas ao longo dos séculos que antecederam a época cristã:
1ª - O templo - Houve em Israel muito trabalho relacionado com a questão do templo. Isto pode ser visto nas obras de Esdras, Neemias, Ageu, Malaquias, Zacarias, um pouco de Naum. Estas obras, assim como passagens inteiras em Levíticos, influenciaram muito em Israel um cuidado todo especial em função da questão do tempo. Percebe-se nessas obras uma religião centrada no templo de Jerusalém. O templo de Jerusalém se tornou uma grande instituição em Israel. Mal comparando, temos, no mundo moderno a figura do Papa. Uma decisão do Papa em Roma traz uma repercussão para o catolicismo no mundo inteiro. Quando ocorre uma crise neste templo, através de estrangeiros que profanaram o templo, como pode ser visto no livro de Daniel – o abominável da desolação – Quando o templo já não é suficientemente puro para a religião de Israel, eles começam a olhar para fora do templo. Uma dessas formas de “olhar para fora” do templo é a literatura apocalíptica.
2ª - A Monarquia – Houve também uma falência muito grande nesta instituição, que está muito próxima do templo, até mesmo fisicamente. A figura do rei, a figura do messias que se senta sobre o trono, essas figuras foram coisas que com o passar dos tempos se desgastaram historicamente. Vários messias, a partir de David, sentaram-se no trono de Israel, no entanto, na época do período anterior ao novo testamento, cerca de 2 ou 3 séculos antes, há uma idéia na cabeça da população de que um rei humano, histórico, não será suficientemente poderoso para restaurar a sorte, a felicidade, a benção de Israel. Há aqui também um olhar para fora da monarquia. Surge a idéia do messias, o filho do homem, o filho de Deus, que restauraria Israel. Com a falência da monarquia, o movimento apocalíptico começa a procurar um novo messias. Acredita-se que os essênios eram na verdade um grupo de Judeus dissidentes do templo de Jerusalém que foram para o deserto e que acreditavam que do meio deles surgiria o messias que traria a restauração de Israel. Por essa época, Israel era uma caldeira fervente e movimentos como os dos essênios surgiram aos montes em Israel. Entretanto, eles não tinham força militar e política para um enfrentamento com os romanos. Eles enfrentaram com a arma mais forte que eles possuíam, que era a dimensão religiosa.
Os movimentos religiosos, cristãos e não cristãos, da atualidade só existem por que as instituições tradicionais do ocidente fracassaram. Estas instituições tradicionais ainda existem, mas elas não respondem mais satisfatoriamente à população, à cultura, ao mundo moderno. Por exemplo, o catolicismo, de cortes ainda medievais e o protestantismo, que é umas instituições tipicamente modernas, européias, já não respondem mais às determinadas indagações como respondiam a trezentos ou quatrocentos anos atrás.
3ª - Os apocalípticos – O movimento apocalíptico surge da falência das instituições religiosas em Israel. Ele é um movimento social e não institucional. Não há como encontrar evidências físicas deste movimento, como por exemplo, templos, altares, etc. É um movimento de idéias e a grande produção deste movimento que ficou foi a literatura. Dessa literatura apocalíptica surgiram os apocalípticos. Temos o apocalipse no novo testamento, no antigo testamento, no livro de Daniel, e também e muito mais fora da bíblia. Há literatura que só se conhece por citações em outras literaturas da época, que visivelmente foram influenciadas pelas técnicas literárias apocalípticas. Assim como hoje, quando estudamos literatura, existe literatura que se encaixa no modernismo, romantismo, barroco, arcadismo, existe uma literatura em Israel que se encaixa como profética outra que se encaixa como apocalíptica outra que se encaixa como sapiencial.
Há uma diferença entre apocalíptico e escatológico. Apocalíptico é um gênero literário, essencialmente simbólico e escatológico é um tema, uma idéia teológica.
O texto apocalíptico não é a transcrição do que foi dito no passado para um grupo de pessoas reunidas. Ele é uma peça literária que foi escrita por uma pessoa, que para dar sentido ao todo, usa elementos e técnicas literárias. O escritor não reproduziu a fala de alguém, mas pensou sistematicamente sobre o que estava escrevendo.
Encontramos na pesquisa escatológica dos textos proféticos os seguintes temas: Intervenção de Javé, convocação das nações, vinda do inimigo à terra de Israel, resto de Israel, Juízo divino, castigo do inimigo, fenômenos cósmicos, nova ordem cósmica.
A grande característica da literatura apocalíptica é o fato de quem escreve não escreve por acaso. Escreve o que sonhou e o que Deus ditou. O autor do texto não é quem escreve, mas quem o manda escrever. Na literatura sapiencial o autor escreve o que ele mesmo está dizendo. Na legislação é Deus quem revela, mas é o legislador quem escreve. Na literatura apocalíptica, o escritor é um emissário quase que passivo. Isto pode ser observado quando o escritor faz perguntas ou dá explicações sobre o que está sendo dito, como por exemplo no apocalipse de João.
Precisamos entender três momentos nos escritos bíblicos. Primeiro o profetismo, que trata de assuntos relacionados com a monarquia, o culto, o pecado, impurezas. Num segundo momento temos as profecias escatológicas (apocalíptica), onde há determinadas partes dos textos dos profetas que, ainda que não sejam apocalípticos, trazem assuntos escatológicos e num terceiro momento temos a apocalíptica, onde o assunto é puramente escatológico.
Seja bem-vindo
A proposta é descrever o que penso, sem o compromisso de fazer pensar como eu penso. É também um questionar de algumas situações que me cercam, me alegram, me incomodam, enfim, me descontroem e me constroem a cada dia. Pensar sem medo de fazer um auto-flagelo de idéias que devem ser maltratadas a ponto de serem expurgadas, se preciso for. Pensar e repensar no que creio e no que deixo de crer.
Se eu conseguir pensar sobre o que penso e de alguma forma multiplicar o que penso, seja para que outros pensem parecido, ou para que outros pensem exatamente o contrário do que penso, me fazendo repensar, ficarei satisfeito.
(no começo, eram reflexões sobre as aulas de Teologia no Centro Universitário Bennet)
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